Neste texto, tento encontrar respostas para mim mesmo sobre o que é uma sinceridade verdadeira, o que é administrar a verdade nas relações interpessoais e comigo mesmo? Que implicações tem a sinceridade para que ela seja uma sinceridade legítima?
Queria falar da sinceridade,
principalmente aquela que temos que ter com nossa própria pessoa. Porque
pode ser que tenha sinceridade suficiente com outro alguém, mas comigo
mesmo posso não ter.
Dizer a verdade é uma das questões mais
difíceis que podemos ter em qualquer relação por conta dos muitos
valores, sentimentos e situações normalmente exigidos pela necessidade
de conviver. Sensações de culpa, medo, rejeição, insegurança na reação
das pessoas, vergonha, arrependimento podem ser algumas das muitas
delas.
Historicamente,
quem mais fala a verdade, embora ela seja tão alardeada e valorizada, é
quem mais está próximo de padecer perseguições e afastamentos, porque a
sociedade não parece estar pronta para aceitar o que é verdadeiro. Não
me refiro nem ao respeito para com o outro, quando tentamos não falar
sobre a realidade de sua aparência, de suas limitações, ficando a
procurar uma outra forma de falar sem machucar.
Acima de ser
sincero e verdadeiro, acho que devemos ser muito sensíveis, medindo bem
as palavras, respeitando a opinião de cada um, suas escolhas, seus
fracassos, mas procurando, na medida do possível, entender que elas têm
coração. E ainda mais: cada pessoa tem uma medida de tolerância, de
força, de fragilidade. O que pensamos poder dizer a uma pessoa já não
pode ser construtivo ou dito do mesmo modo a outros.
Por isso, ser
sincero com os outros exige experiência, paciência para pensar no que
dizer ou não-dizer e sensibilidade. É minha opinião.
Notar o que as pessoas aparentam ser ou tentam ser, tentar
visualizar o que talvez elas tentem esconder ou mostrar demais no
discurso, no silêncio, no seu modo de ser pode parecer razoavelmente
fácil, um exercício quotidiano. Outra coisa é ter consciência do nosso
próprio ser, do que escondemos na voz e no silêncio.
Existem
muitas formas de conceber as verdades em jogo: o que sei de mim e o que
tenho certeza que sei, com menção honrosa para comentários, fofocas e o
que acho das pessoas.
Todo ser humano tem sentimentos, todos podem apresentar diversos tipos de falhas, algumas brandas, outras insuportáveis, mas todos falhamos, isto é um fato muito óbvio.
Contudo, nessa administração
da verdade, existe uma sinceridade que tenho que ter acima de todas:
sinceridade comigo mesmo. Quando, então, não estou sendo sincero comigo?
Não tenho leituras nem
textos para apontar sobre isso, por isso, vou tentar descobrir aqui e
agora. Creio que é possível praticá-la quando o que respondo sobre mim é
sim e não; posso até ter dúvidas, mas contanto que sejam dúvidas reais.
Não creio ser sinceridade quando sei que tenho que fazer escolhas e
fico adiando, na esperança de que algum fato mágico ou surpreendente,
tal qual um tufão seguido de uma tsunami, mude, transforme a ordem das
coisas em minha vida. Estou transferindo uma responsabilidade que é
minha para o acaso.
Estar vivo, existir implica em muitas responsabilidades.
Acredito que a sinceridade deve envolver uma ação, um conjunto de
atitudes. Nunca uma forma estática de conhecer, opinar sobre as coisas,
sobre mim, sobre o mundo.
Posso ser sincero criticando o governo e
suas ações ou falta de ação, mas o que tenho feito para impedir esse
quadro indesejável? Para até ajudá-lo a ser menos vil, traiçoeiro,
corrupto e enganador? Não conheço nada sobre os deputados, sobre o
senado, sobre o que eles fazem. Mas o que tenho feito para procurar
conhecer, para ver se existe alguma possibilidade de comunicação e até
de participar em algum projeto que seja genuinamente digno e justo?
Posso falar sobre a importância fundamental do amor nas relações e na prática o que tenho feito para efetivar essa visão idealista?
Falo sobre a poluição e seus múltiplos males que podem atravessar
séculos condenando a natureza, a humanidade e suas futuras gerações a
uma vida cada vez mais distante de um padrão mínimo de qualidade,
contudo nas minhas ações o que tenho feito, o que tenho procurado conhecer sobre o que é possível fazer para diminuir
os efeitos da poluição? A consciência ecológica é bem fácil de ser
visualizada no verão. Se formos às muitas praias agora, podemos
contemplar ainda o lixo atirado no mar, nas areias por muitos: copos de
plástico, restos de comida, preservativos, vidros quebrados, sinais de fogueiras, etc.
Creio que primeiro é preciso ter consciência que a vida
não deve ser vivida à toa, apenas por viver, apenas por existir, apenas
para encontrar o dia e a noite, bater o ponto em algum trabalho,
aproveitar o que aparenta ser o melhor em termos de prazer que a vida
pode proporcionar.
Ser sincero implica em avaliar tudo o que diz respeito à vida como um
todo, tendo consciência que vivemos em grupo e necessariamente nunca
sozinhos ou com grupinhos a humanidade chegaria a lugar nenhum.
Além desta vida em grupo,
tem também a vida pessoal. Ora, quantas vezes não vivemos de
aparências? Sem dar uma resposta firme aos nossos objetivos verdadeiros,
sentimentos que perturbam incessantemente o coração? Quantas vezes precisamos reconhecer um erro, tentar reconstruir o que esse erro destruiu e vacilamos, ficamos paradinhos, encalhados em um mar de indecisões, naufragando ao invés de nadar em alguma direção? E o pior: sabemos que existe uma direção, existe ainda um barco e ficamos vendo até que ponto podemos resistir ao naufrágio??!!
Eu me olho no espelho e me vejo, começo a sentir que preciso
fazer algo por mim. Se a vida sedentária me trouxe muitos quilos a mais,
é fácil reconhecer que preciso reeducar minha alimentação, reeducar
minhas práticas diárias; talvez tentar uma academia ou exercícios em
casa mesmo. Só que em diferentes aspectos, muitas pessoas preferem
engordar até perder o movimento, perder a saúde, chegar a um ponto de
explodir. Esse tipo de gordura não falo só da material, física não.
Existe muita gordura no coração, muita gordura "diabetizando"
o caráter, impedindo o pensamento de se movimentar, tirando a força,
pesando, pesando, enfraquecendo. E isto mesmo que tenhamos consciência
de que existe uma saída.
É esse tipo de sinceridade que acredito
ser verdadeira, quando nossas ações e sensibilidade fazem valer a
existência, cada segundo, minuto, dia após dia.
É preciso saber
avaliar o caminho que estamos indo, o que queremos de verdade para nossa
vida e o que estamos fazendo para alcançar nossos reais propósitos. O
que esperamos do tempo, do nosso trabalho, da família, dos amores.
Como,
por exemplo, aproveito meu tempo na internet tão cheia de conhecimentos
e novidades, mas com tantos atalhos para seduções e descaminhos? Quantas horas dedico às minhas obrigações no escritório e quanto tempo fico conversando no msn, vendo Facebook, Orkut, Twitter?
Depois, reclamo do atraso, da falta de tempo; nem tento lembrar que faz
tempo que não o jornal, nem sei como está o meu mundo, meu estado,
minha cidade.
Creio que nesta administração
da verdade dizer não a nós mesmos nas situações precisas implica em
dores que podem até demorar a passar; contudo, tal qual um remédio
amargo, um sim ou um não que tenham base no que é justo, no que é
correto, podem trazer a cura para muitos dos problemas vividos e dos
dramas e desesperos que perturbam a alma.
Eu já vivi muita crise de sinceridade e baseada nela escrevi esse
texto. Tenho descoberto que vale à pena lutar para que a sinceridade
ganhe cada dia mais espaço em meu viver. Tenham todos uma ótima semana.
(Jackson Angelo)