Seu livrinho está aí
Dentro do seu coração
Fora do seu coração
Em cima da terra
Bem debaixo do chão
Está nas pedras que despencam das montanhas altas
E está no pó dos dias que já desceram à cova:
Os dias da tua vida
Seu livrinho cuja capa tem tua face
Tem ainda tua maquiagem, quimeras e delírios
E o choro sangrento que nunca foi mostrado
Ou o sorriso que teima em escapar
A força que ainda insiste, e por vezes jorra cristalina
Dando ainda condições pra suportar a leitura e a vida dessa leitura
Seu livrinho de cujas páginas já fez barcos de papel
E tantas vezes naufragou nesse mar do teu entendimento
Ou no fundo abismal da confusão de significados
Onde afogas o que não podes compreender
Ou não aceitas nem verdades nem mentiras
Nem morrer nem viver
Nem lutar nem fugir, o que então?
Seu livrinho está aí
Parado sem acompanhar o relógio
Enquanto a vida pouco a pouco se vai
Sem caminho, com luz?! ou sem luz?!
Mas, para que? A história vai ser escrita afinal?
Meu livrinho, do qual nem eu mesmo quero ser leitor!
Que historia então irei contar?
E pra quem? Se não acreditar na sua própria história?
Ou será uma desistória?
Um universo sem elos entre e a inexistência e não-existência?
Algo que não morre porque nunca nasceu nem viveu nem cresceu
Meu livrinho, cujas palavras ficam fugindo de qualquer vocabulário
De qualquer código linguístico, qualquer forma de escrita
Da fantasia que nunca se realiza
As mesmas fantasias que já nem fascinam mais a ninguém
Sopra o pó de cima das páginas
Abre alguma delas
Lê uma frase, um verso
Termina algum capítulo
Enterra os mortos que ficaram no caminho
Cumprimenta os novos personagens
Joga o lixo na lixeira!
Vê as figurinhas
Não estão faltando algumas?
Algum nome não precisa ser mencionado?
Alguns acentos corrigidos?
Algumas linhas refeitas?
Então, finalmente terás uma história!
Porque participaste dela, da tua vida!
(Jackson Angelo, em 18 de agosto de 2009, 21h36)