A mulher de um único fio de cabelo

A mulher de um único fio de cabelo (Jackson Angelo)

Ela viveu assim com a mão no seu único fio de cabelo. Ora, com uma mão ora com outra. Quando o fio de cabelo cumpria seu ciclo de vida, a mulher de um fio de cabelo só ficava muito triste. Ela usava as melhores perucas e se cuidava com os mais confiáveis cabelereiros (por favor, pesquisem bastante antes de admitir como certo que todo cabelereiro é fofoqueiro), mas de verdade mesmo só seu único fio de cabelo. O fio de cabelo nunca passava de doze centímetros, mas era o único, por isso tão importante! 

Ursinhos de pelúcia, gato angorá, rendas e franjas nas bordas das almofadas, pufes, travesseiros, passadeiras, tapetes, recamiers, aparadores, molduras etc. Por onde os olhos revistassem e contemplassem seu lar, havia algo que lembrasse pelos e cabelos. Como quem decora a casa de quadros retratando pessoas e ambientes alegres quando o que mais tinha em sua camuflada realidade era a falta de alegria, que nem sempre é a tristeza.

Explicando: Fiz esse texto numa brincadeira que tive com mãe, ontem. Ela tava toda despenteada. Aí eu falei: "Mãe, seu cabeleireiro não lhe deixou bonita hoje, hein!". Ela riu. Como ela tem problemas na tireoide, seu cabelo fica caindo e dá aparência de rápida calvície em alguns cantos do couro cabeludo. Aí inventei a mulher de um fio de cabelo só: "Mãe, do jeito que tá indo nesses dias a senhora só tem um fio de cabelo. Aí vai ficar o tempo todo com a mão nele protegendo: - Oh! Meu fio de cabelo!".